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Janelas Abertas – Escritos de Circunstância
. Prefácio
Ler estes textos esparsos de meu amigo Fredie Didier Junior é ter a chance de recompor fragmentos de uma bela história. E de (re)descobrir as profundas conexões entre eles. Ao me dar conta de que já conhecia parte substancial
destes escritos, vejo em perspectiva sua bonita caminhada. Reencontro amigos de um velho parceiro de trilhas, e sou apresentado a alguns outros.
Este livro é muito relevante. Brotam das palavras do autor os interessantes frêmitos da juventude, a evolução do seu pensamento, os seus temas recorrentes, frutos de tantas conversas nossas. É um documento intensamente veraz da sua existência até aqui.
Todo artista e todo pensador tem seu vocabulário, seus fantasmas, seu universo de angústias e prazeres. Sua assinatura. Nestes textos está seu DNA, seu diamante verdadeiro. Nele repousam suas saudades.
Ao palmilhar o chão de sua trajetória, Fredie fez amigos, formou discípulos, ampliou seu público e brilhou em diversos palcos, dentro e fora do Brasil. Sua fidelidade aos afetos que nutre desde sempre é comovente; sua atenção às sutilezas é ora engraçada, ora poética.
Não acredito em intelectuais que habitam a torre de marfim das certezas absolutas, nem nos eremitas vaidosos que se afastam das pessoas. Só creio em intelectuais que sabem almoçar sentados no chão. Segundo famosa figura baiana, Fredie é tudo menos um adulto: tudo o que, nele, não é criança é idoso demais. Ou seja, ele nasceu há dez mil anos atrás para entre nós ser um eterno infante.
Se a arte é a imitação da vida, o cinema é a arte da captação do seu incessante movimento. Um dos seus grandes diretores, o francês Eric Rohmer, parecia não filmar nada de extraordinário. Demorava-se sobre tertúlias burguesas em seus contos para a tela, e a ação transcorria sem maiores sobressaltos até que repentinamente sobrevinha algum instante de revelação que conferia todo o sentido à história. A ideia central do seu cinema maiúsculo é exatamente essa: ao filmar o cotidiano em seus aparentes tempos mortos, em seu recorrente anticlímax, ele revelava os mais importantes acontecimentos da existência.
Didier Jr., voyeur de miudezas, debruça-se apaixonadamente sobre temas que poderiam parecer menores diante de olhos menos treinados. Comenta, por exemplo, as evoluções e reveses das gincanas colegiais na cidade de Salvador, e analisa a música baiana feita para as massas com o mesmo envolvimento com que discorre sobre temas aprofundados de sua paixão científica, o processo civil. É, por assim dizer, um Eric Rohmer banhado numa espécie de dendê primordial
(aquele verniz filosófico de que são feitos os grandes baianos, dos antigos aos novíssimos).
Como bem disse Gilberto Gil, “se a noite inventa a escuridão/a luz inventa o luar/o olho da vida inventa a visão/doce clarão sobre o mar/já que existe lua/vai-se para a rua ver/crer e testemunhar”. Fredie conduz sua vida, até hoje, como um autêntico gincanista, e isso é o que ele é em essência,após decantadas todas as outras densas camadas que se foram aderindo à sua personalidade ímpar.
Afinal, ainda aceita sem pestanejar os constantes desafios, busca os melhores caminhos para chegar lá (ou pelo prazer de caminhar) e jamais deixou de ir à rua caçar os tesouros. O menino segue vivo e muito liberto, nos viradões das madrugadas, sempre aprendendo a inventar sua visão – doce clarão sobre o nosso mar de incertezas.
Que bom que estamos aqui para ver, crer e testemunhar a delícia deste instante.
Jorge Santiago Jr.
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