É muito comum a divisão das decisões judiciais em terminativas e definitivas. O critério para a elaboração dela é a natureza jurídica das questões decididas: no primeiro caso, estar-se-ia diante das decisões sobre as questões processuais; no outro, das questões de mérito.
A classificação não está imune a críticas, porém. É preciso refletir sobre ela, até mesmo para ajudar a resolver a questão da aptidão das decisões terminativas a ficarem indiscutíveis pela coisa julgada.
¬O adjetivo definitiva deveria ser utilizado para qualificar a estabilidade de uma decisão judicial, e não o seu conteúdo. E a estabilidade de uma decisão judicial está relacionada à profundidade da questão que o órgão jurisdicional resolveu.
Uma questão pode ser resolvida em cognição sumária ou exauriente. Uma decisão fundada em cognição sumária não tem aptidão de tornar-se definitiva, ao contrário de uma decisão fundada em cognição exauriente.
Qualquer questão pode ser conhecida sumária ou profundamente.
Uma questão processual pode ser conhecida em cognição exauriente, como acontece quando, na fase de saneamento, o órgão jurisdicional resolve as questões relativas à admissibilidade do procedimento. Uma questão processual pode ser conhecida sumariamente, como ocorre nos casos em que o órgão jurisdicional admite a petição inicial e ordena a citação do réu. Nada impede que, posteriormente, após a apresentação da defesa, o magistrado reveja o seu posicionamento.
Uma questão de mérito pode ser examinada sumariamente, como acontece na análise do pedido de tutela antecipada, ou profundamente, quando o órgão jurisdicional resolve o objeto litigioso do procedimento (julgando o pedido formulado na petição inicial, no recurso, na petição do incidente etc.)
Note-se, ainda, que uma questão processual pode ser uma questão de mérito. A competência, por exemplo, pode ser examinada como questão principal e de modo exaustivo na exceção de incompetência relativa e no conflito de competência. O mesmo pode ocorrer com a parcialidade do julgador, objeto do incidente de argüição de suspeição e impedimento. Assim, é possível que algumas questões sejam de admissibilidade, em relação a um dado procedimento, e de mérito, em relação a outro. Jamais uma mesma questão pode ser de admissibilidade e de mérito em relação a um mesmo procedimento. Na prática, não se costuma tomar o cuidado de atentar para essa sutileza. Quando uma questão processual compõe o mérito, haverá outras questões processuais que serão questões de admissibilidade. Essa observação é importante, pois, sendo questão de mérito de um procedimento uma condição da ação ou um pressuposto processual, a sua análise estará apta a ficar imune com a coisa julgada material. O mérito de um procedimento pode ser composto exclusivamente por questões processuais.
É muito mais adequado, portanto, dividir as decisões em provisórias e definitivas, em relação à sua estabilidade, e em decisões de admissibilidade do processo e decisões de mérito. Decisões definitivas têm aptidão para tornar-se indiscutíveis. O adjetivo definitiva nada tem a ver com o conteúdo da decisão, mas com a sua estabilidade. O adjetivo terminativa, de outro lado, nada diz: toda decisão, de certa forma, termina algo (uma fase ou o próprio procedimento).
É possível fazer um entrelaçamento das classificações.
Há, assim, a) decisões de admissibilidade provisórias; b) decisões de admissibilidade definitivas; c) decisões de mérito provisórias; d) decisões de mérito definitivas.
Essa sistematização auxilia na compreensão da coisa julgada das decisões de admissibilidade (verdadeira coisa julgada formal, como afirma Luiz Eduardo Mourão), plenamente possível, embora muitas vezes ignorada.
Fredie Didier Jr.
Roberto Gouveia Filho