Editorial 81

Cláusula geral é uma espécie de texto normativo, cujo antecedente (hipótese fática) é composto por termos vagos e o conseqüente (efeito jurídico) é indeterminado. Há, portanto, uma indeterminação legislativa em ambos os extremos da estrutura lógica normativa. Há várias concepções sobre as cláusulas gerais. Optamos por essa para fins didáticos, além de a considerarmos a mais adequada, mas não se ignora a existência de outras.

A técnica das “cláusulas gerais” contrapõe-se à técnica casuística. Não há sistema jurídico exclusivamente estruturado em cláusulas gerais (que causariam uma sensação perene de insegurança a todos) ou em regras casuísticas (que tornariam o sistema sobremaneira rígido e fechado, nada adequado à complexidade da vida contemporânea). Uma das principais características dos sistemas jurídicos contemporâneos é exatamente a harmonização de enunciados normativos de ambas as espécies.

É indiscutível que a existência de cláusulas gerais reforça o poder criativo da atividade jurisdicional. O órgão julgador é chamado a interferir mais ativamente na construção do ordenamento jurídico, a partir da solução de problemas concretos que lhe são submetidos.
As cláusulas gerais desenvolveram-se inicialmente no âmbito do Direito Privado, cujos principais exemplos são as cláusulas gerais da boa-fé, da função social da propriedade e da função social do contrato.

Ultimamente, porém, as cláusulas gerais têm “invadido” o Direito processual, que naturalmente sofreu as conseqüências das transformações da metodologia jurídica no século passado. Afinal, o Direito processual também necessita de “normas flexíveis que permitam atender às especiais circunstâncias do caso concreto” (LEHMANN, Heinrich. Tratado de derecho civil. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, s/a, v. 1, parte general, p. 58).
O princípio do devido processo legal é o principal exemplo de cláusula geral processual.
O CPC brasileiro contém outros vários exemplos de cláusulas gerais: a) cláusula geral executiva (art. 461, § 5º, CPC); b) poder geral de cautela (art. 798 do CPC); c) cláusula geral do abuso do direito do exeqüente (art. 620 do CPC); d) cláusula geral da boa-fé processual (art. 14, II, CPC); e) cláusula geral de publicidade do edital de hasta pública (art. 687, § 2º, CPC); f) cláusula geral de adequação do processo e da decisão em jurisdição voluntária (art. 1.109 do CPC) etc.

A existência de várias cláusulas gerais rompe com o tradicional modelo de tipicidade estrita que estruturava o processo até meados do século XX (MARINONI. Luiz Guilherme. “Idéias para um ‘renovado direito processual’”. Bases científicas para um renovado direito processual. Athos Gusmão Carneiro e Petrônio Calmon Filho (org.). Salvador: Editora Jus Podivm, 2009, p. 143).

No Direito processual civil brasileiro, porém, as cláusulas gerais aparecem soltas, como se houvessem sido previstas sem qualquer preocupação sistemática.
A produção doutrinária e as manifestações jurisprudenciais sobre as cláusulas gerais são quase infinitas. Notadamente na Alemanha, há um vastíssimo número de ensaios doutrinários a respeito do tema. Tudo isso contribuiu para que as cláusulas gerais fossem aplicadas de maneira dogmaticamente aceitável e, conseqüentemente, de modo a que se pudessem controlar as decisões judiciais que nelas se baseassem.

O operador jurídico não pode prescindir desses subsídios na aplicação das cláusulas gerais processuais, atualmente tão abundantes.

Trata-se de uma das principais características do direito processual civil contemporâneo.

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