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Editorial 136
O Superior Tribunal de Justiça, como se sabe, admite reclamação constitucional contra decisão de Juizado Especial Cível que diverge da sua orientação jurisprudencial. Para regular a reclamação com tal finalidade, a Corte Especial do STJ houve por bem editar a Resolução nº 12, de 14 de dezembro de 2009, que prevê, expressamente, a reclamação com tal objetivo, admitindo, até mesmo, a concessão de provimento liminar que ordene a suspensão de todos os casos similares em curso no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais.
Nos termos do art. 1º da Resolução n. 12/2009, a reclamação deve ser ajuizada no prazo de 15 (quinze) dias, contado a partir da ciência da decisão impugnada. Ultrapassado esse prazo, não se admite o ajuizamento da reclamação, pois terá havido o trânsito em julgado.
A partir da aludida Resolução nº 12/2009, o STJ passou, enfim, a admitir a reclamação constitucional destinada a eliminar a divergência havida entre decisões proferidas por Juizados Estaduais e precedentes daquela Corte Superior que formam jurisprudência dominante sobre determinado assunto que envolve causas repetitivas.
Posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça tornou-se mais exigente quanto ao cabimento da reclamação contra decisões proferidas por Juizados Especiais Cíveis, somente a admitindo se houver divergência da decisão reclamada com precedentes proferidos em julgamento de recurso especial repetitivo, ou se houver divergência com enunciado da súmula de sua jurisprudência. Confira-se, a propósito, o seguinte julgado: STJ, 2a S., Rcl 4.858/RS, rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, rel. p/ acórdão Min. NANCY ANDRIGHI, j. 23/11/2011, DJe 30/11/2011.
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a reclamação contra decisão do Juizado Especial Cível somente se revela cabível quando a divergência disser respeito à interpretação de texto normativo de natureza material. Se a divergência for de interpretação de norma de direito processual, não se admite a reclamação. Com efeito, “[e]stão excluídas do âmbito de cabimento da reclamação formulada com base na Resolução n. 12/2009-STJ as questões de ordem processual” (STJ, 2a S., AgRg na Rcl 4682/AL, rel. Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, j. 25/5/2011, DJe 1º/6/2011. No mesmo sentido: STJ, 2a S., AgRg na Rcl 6.428/MG, rel. Min. ANTONIO CARLOS PEREIRA, j. 9/11/2011, DJe 24/11/2011. Também no mesmo sentido: STJ, 1a S., AgRg na Rcl 6.995/MG, rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, j. 23/11/2011, DJe 2/12/2011).
O STJ tem sido exigente a respeito do cabimento da reclamação constitucional nesses casos. Segundo tem entendido, trata-se de medida excepecional, estando “… reservada somente para a análise de hipóteses extremas, em que se verifique frontal ofensa a julgado deste Tribunal, cuja solução decorra da aplicação da lei federal e não da melhor ou pior intepretação que se possa fazer dos fatos da causa” (STJ, 2a S., AgRg na Rcl 5.046/DF, rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j. 26/10/2011, DJe 4/11/2011).
Diante da quantidade significativa de reclamações ajuizadas com tal finalidade, o STJ passou a adotar uma jurisprudência defensiva quanto ao seu cabimento. Não tem, como visto, admitido a reclamação por divergência de norma processual.
Não obstante essa restrição, a 2ª Seção do STJ deverá julgar reclamação sobre multa cominatória em ação de exibição de documentos. A Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI admitiu reclamação proposta por um banco contra acórdão do Colégio Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de São Paulo, que manteve sentença que determinou a apresentação dos extratos bancários de uma cliente, sob pena de multa. Em sua reclamação, o banco alega que a decisão contraria o teor do enunciado n. 372 da Súmula do STJ, segundo o qual não cabe multa cominatória em ação de exibição de documentos.
Este é um exemplo de que não se deve restringir o cabimento da reclamação contra decisão de Juizados Especiais Cíveis que divirja de enunciado sumular ou de jurisprudência domintante do STJ. Não se deve apequenar uma das principais funções do STJ, que é a de uniformizar a jurisprudência nacional, tanto no tocante ao direito substancial como no que respeita ao direito processual. Muitas das divergências jurisprudências são verificadas no âmbito do direito processual, não havendo razão para que se asfate o cabimento da reclamação neste último caso.
O caso reforça esta tese, que defendemos no v. 3 do Curso de Direito Processual Civil (2012, 10ª. ed.).
O excesso de casos não legitima a jurisprudência defensiva, não devendo o STJ limitar seus próprios poderes ou apequenar sua função institucional em prol de uma diminuição de trabalho. A eliminação da divergência constitui, por si só, fator decisivo e importante para eliminação da excessiva carga de trabalho, conferindo, em útima análise, isonomia, segurança jurídica e confiança legítima.
Fredie Didier Jr.
Leonardo Carneiro da Cunha