Editorial 102

O projeto de NCPC praticamente reproduziu o regramento já existente sobre o foro negocial.
Há, porém, aparentemente, uma mudança.

É que não há no Projeto dispositivo semelhante ao par. ún. do art. 112 do CPC: “A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu”.

Esse dispositivo foi acrescentado ao CPC em 2006, pela Lei n. 11.280. Tratava-se, então, da consagração legislativa de um entendimento jurisprudencial construído a partir da aplicação do CDC às cláusulas de foro negocial abusivas existentes em contratos de adesão de consumo.

Nestes casos, embora dissessem respeito a regras de competência relativa, poderia o órgão jurisdicional reconhecer de ofício a sua incompetência, se constatasse a abusividade da cláusula de eleição do foro.

O legislador, em 2006, resolveu estender o entendimento a qualquer tipo de contrato de adesão, seja ou não de consumo.

Note-se que o entendimento jurisprudencial foi construído sem texto normativo expresso que o embasasse. Fundava-se na aplicação direta de princípios de proteção ao consumidor, havido como hipossuficiente nas relações de consumo lastreadas em contrato de adesão.
O NCPC não repetiu a regra do parágrafo único do art. 112 do CPC.

Essa omissão certamente gerará duas interpretações antagônica: a) ou se volta ao sistema anterior, em que, a despeito do silêncio do CPC, era permitido ao órgão jurisdicional determinar a remessa dos autos ao domicílio do réu, após o reconhecimento da abusividade da cláusula contratual de eleição; b) o legislador teria revogado a norma que autorizava essa conduta: valeria a regra geral de que a incompetência relativa, mesmo aquela decorrente da abusividade de uma cláusula negocial de foro, não pode ser reconhecida de ofício pelo órgão jurisdicional.

Notem que, a prevalecer o segundo entendimento, haveria um retrocesso desnecessário na tutela da parte contratual hipossuficiente em contratos de adesão.
Para evitar discussões desnecessárias, que aumentam o risco de retrocesso na tutela dos direitos, parece mais adequado reproduzir, no NCPC, a regra que consta do par. ún. do art. 112 do CPC.

O NCPC já nasce com uma série de discussões novas. Convém concentrar nossa energia nelas. Problemas desnecessários devem ser evitados.

Fredie Didier Jr.

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